Neste final de semana nosso antigo pastor nos ligou, meio temeroso diga-se de passagem, pois estava querendo saber nossa situação uma vez que estavam fazendo um recadastramento dos membros da Nova Canaã e as pessoas que já não iam à igreja a algum tempo seriam excluídas do rol.
Não vamos lá já faz mais de um ano, por motivos diversos que eu já devo ter contado aqui ou nas versões antigas deste blog. E eu já sabia que seriamos excluídos, tanto é que não me importava. O fato é que não senti nenhum interesse não só dele mas também dos membros daquela igreja de nos procurar, de saber como estávamos e de nos amar. De tentar nos manter no rol.
Disse-lhe a verdade: que temos ido à Memorial do Centenário, igreja aonde realizamos nosso casamento. É verdade que esporadicamente, mas temos. Só que o fato de estarmos perigando ficar “descartados” (e desse termo a Cris riu bastante) vai nos forçar a pedir carta para lá. E eu não tenho sido muito fã da idéia.
Não que eu não goste de lá, pelo contrário. Mas é que esta questão de carta, membro e tal, que são coisas bem batistas, não me estimulam muito, pelo contrário. E eu não tenho me sentido muito “evangélico de carteirinha” já faz anos. Me parece que eu tenho que ter um certificado de sócio, ou que a igreja tem que ter uma carta de propriedade sobre mim. Não é nada disso, eu sei, é apenas para que a estrutura de assembléia da igreja funcione adequadamente, mas isso sempre me deixou incomodado.
Eu tenho uma visão muito crítica do mundo, e isso nunca me fez ser uma pessoa popular, muito menos na igreja. Observo tudo com fé, e ao mesmo tempo com ceticismo. Existem coisas que a religião diz serem erradas que eu sei que são, e outras que eu sei que não são, mas que insistem em dizer que são e não toleram idéias diferentes. Como eu disse, isso é a religião, e não Jesus. A pior coisa que tem é quando as pessoas tentam misturar Jesus à religião. Ela é vivida por humanos e, como tudo o mais que os humanos fazem, é corruptível.
Eu disse a Cris que o cristianismo como o conhecemos hoje tem uma raiz muito arrogante e cruel, de assumir que só ela é a verdade única, e que tudo o mais que está fora dela é errado, mentiroso e ruim. Jesus diz, com propriedade, que Ele é o caminho, a verdade e a vida. Eu creio nisso de todo o coração. Mas não tem pessoa no mundo que me faça acreditar cegamente em muitas coisas sem sentido que vejo sendo pregadas nas igrejas, as quais eu sinto não terem sido declaradas por Jesus.
Não acredito que tudo o que dizem ser pecado de fato o seja. Vejo por exemplo literaturas evangélicas falando mal de filmes maravilhosos como o Ultimo Samurai, do qual eu mesmo escrevi certa vez destacando diversos aspectos positivos para qualquer cristão (ou não-cristão também). Estou lendo “A Bússola Dourada”, que quase todo crítico e formador de opinião evangélico diz ser satanista, apenas porque a história trata exatamente do que eu estou falando: sobre questionamentos à igreja e à verdade absoluta da qual nunca se deveriam ter dúvidas, afinal, se houver dúvida, deixa de ser verdade absoluta e todo o seu paradigma se esfacela.
As igrejas não tem espaço para dúvidas e debates acerca de questões delicadas, ligadas a seus mais dogmáticos alicerces. Afinal, assume-se sua cultura como verdade absoluta e inqüestionável. Já tentei diversas vezes conversar sobre coisas um tanto quanto polêmicas, e o tipo de resposta que eu sempre acabo tendo é o mesmo por parte de meus interlocutores: um visível desconforto, um discurso quase que castrador e centrado totalmente na Bíblia e em suas interpretações. E quando se questiona o fato da Bíblia ter muito provavelmente sido alterada pelo passar do tempo e das traduções, e que a formatação dos livros que a compõe mudou diversas vezes na história seguindo-se critérios duvidosos, somos enfim confrontados com a afirmação de que, se temos dúvidas, não temos fé em Deus, que prometeu que a palavra nunca seria modificada.
Eu aceito a igreja como ela é, mesmo que ela não me aceite como sou (por mais que diga que aceita). Sou um inquiridor e inquiridores nunca são bem-vistos, por mais necessários que sejam para oxigenar conceitos, culturas, idéias e paradigmas. Não tenho pretensão nenhuma de mudá-la, porque eu sei que muitas pessoas tentaram isso durante a história humana e pouco ou nada puderam fazer. Mas eu tenho minhas convicções, e se discordo de alguns pontos, não é por causa disso que vou me sentir abastado ou marginalizado. Procuro me ater aos pontos que meu coração me dizem ser verdade, representados pelos ideais de liberdade, amor, respeito, união, irmandade e paz.
Não julgueis para não serdes julgado. Amai a Deus sobre todas as coisas e ao teu próximo como a ti mesmo. Praticar o bem, buscar a justiça, confessar meus pecados, reconhecer minha incapacidade e pequenez diante do Senhor, entregar a Ele minha conduta, meus pensamentos, meus atos, meus objetivos e meus sonhos. Desejar e buscar a paz entre todos. Ser grato pela minha vida e pelas pessoas que fazem parte dela. Viver da melhor maneira possível, buscando ser a melhor pessoa que eu puder ser: ser como aquela pessoa que Deus me idealizou.
Posso ser estranho, e posso ter conceitos que me desqualificam como aquele crente que todos imaginam. Mas não me sinto em nada desqualificado como cristão. E é isso o que me importa. O mundo é colorido e não monocromático, e a paleta de cores e tons é enorme. Porque todos parecem querer que o mundo seja pintado de sua cor preferida apenas?
2 comentários:
Então Daniel... eu passei pelos mesmos questionamentos que vc e saí. Pra muitos eu me "desviei", mas eu tenho a plena certeza de que encontrei meu caminho, por mais errado que pareça a um ou outro, mas é o que me faz feliz de uma forma verdadeira. Como escutei num filme: "freedom is power". Abs!
É, vontade de sair de vez eu já tive muitas vezes, mas não saio não. Primeiro porque eu não os julgo mais, e quando vejo algo com o qual eu não concordo, ou que tenho uma visão diferente, e se é tão diferente que chega a ser oposto, eu me calo se ninguém me perguntar nada(porque como falei, debates sobre tabus não tem vez). Segundo, porque eu já entendi que preciso da igreja. É paradoxal, mas real. Na maior parte do tempo eu gosto de estar lá, só acho que em certos momentos, mesmo que com o foco certo, o método usado é errado.
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